A criação do estado de Israel
Em 1917, Lord Balfour, o secretário inglês para os Negócios Estrangeiros, fez publicar a Declaração Balfour, em que apoiava a imigração de judeus para a Palestina e o estabelecimento de um "lar nacional para o povo judeu" na região, afirmando que "nada será feito que possa prejudicar os direitos civis e religiosos das comunidades não judaicas existentes" (1). A Grã-Bretanha teve, obviamente, dificuldade de conciliar esta declaração com a estratégia que estava a seguir, no Médio Oriente, de uma aliança com os potentados árabes na guerra contra o Império Otomano.
Em fins do século XIX e princípios do século XX haviam começado as vagas de imigrantes judeus para a Palestina, sob os efeitos dos pogroms. A primeira vaga (1882-1903) provém sobretudo da Rússia e a segunda (1904-1914) da Rússia e Polónia. Antes dessas imigrações, a população judaica na Palestina era insignificante. O facto dessas migrações terem como destino a Palestina estava ligado ao aparecimento do movimento sionista. A expressão formal deste movimento foi o estabelecimento da Organização Sionista (1897), durante o Primeiro Congresso Sionista, reunido por Theodore Herzl em Basiléia, na Suíça. O programa deste movimento continha elementos ideológicos e práticos para a promoção do retorno dos Judeus à sua pátria histórica, onde "os Judeus não fossem perseguidos e pudessem desenvolver as suas vidas e identidade".
Em 1915, depois dessas duas vagas de imigração, viviam aproximadamente 83.000 judeus na Palestina conjuntamente com 590.000 árabes muçulmanos e cristãos. Porém em 1936 são já 400 mil, e em 1947, 600 mil. Para este aumento também concorreram as decisões da Sociedade das Nações, a seguir à Grande Guerra. Com efeito, o documento adoptado pela SDN em 24 de julho de 1922, que confiava o mandato sobre a Palestina à Grã Bretanha (2), precisava:
“O mandatário assumirá a responsabilidade de instituir no país um estado de coisas político, administrativo e económico. capaz de assegurar o estabelecimento do estado nacional para o povo judeu (art. 2). (...) A administração da Palestina facilitará a imigração judaica em condições convenientes e de acordo com o organismo judaico mencionado no artigo 4. Estimulará o estabelecimento intensivo dos judeus nas terras do país, incluídos os domínios do Estado e as terras sem cultivar (art. 6)”.
E, principalmente, a degradação da vida dos judeus na Europa Central e de Leste à seguir à guerra. Assim, em 1920, começaram novas vagas de imigração de judeus do leste da Europa para a Palestina, que se reforçam após a subida de Hitler ao poder. Além dos judeus polacos e de outros países da Europa central, a nova vaga inclui numerosos judeus alemães. Em 1936 estão instalados, na Palestina, 400.000 judeus (3), a grande maioria azkenazes (judeus de tradição cultural germânica e muitos de língua yiddish).
Nas vésperas da guerra e durante esta, a situação foi desfavorável à imigração judaica em virtude da necessidade das potências ocidentais contarem com o apoio dos estados árabes para fazer face a Hitler. Em 1939 os britânicos decidiram limitar a 75.000 a imigração judia nos cinco anos seguintes, depois dos quais cessaria totalmente. Também proibiam as vendas de terras aos judeus na maior parte do território. Enquanto isso havia uma importante imigração árabe proveniente do Egipto e da Transjordânia, regiões muito mais atrasadas e empobrecidas, por razões económicas. A administração britânica e a instalação de colonos judeus, com grande dinamismo e qualificação, tornavam a Palestina bastante mais próspera que os territórios vizinhos.
A instalação dos judeus fez-se por compra das terras, inicialmente baldios, terras desocupadas ou não cultivadas. Só a partir de 1930 começaram a incidir principalmente na aquisição de terras já cultivadas. Era relativamente fácil: os judeus pagavam bom preço por elas e os donos, que ou eram proprietários absenteístas (a maior parte – 73%) ou locais vivendo miseravelmente, aceitavam de boa vontade a transacção. O pai de Ahmed el-Shuqeiri, líder da OLP, vendeu as suas terras a troco de dinheiro.
A partir da Conferência Aliada de Potsdam, de julho de 1945, Truman, novo presidente americano, pediu a Churchill, primeiro-ministro, que levantasse as restrições à imigração judaica à Palestina.
No final da guerra, em 1945, o Partido Trabalhista ganha as eleições. Sete meses antes, durante sua Conferência Nacional, os trabalhistas haviam proposto “o levantamento das medidas que limitavam a imigração de judeus”. Todavia, a esquadra britânica continuava a tentar impedir que os barcos com imigrados judeus chegassem à Palestina, internando, os que apanhava, em Chipre. Aproximadamente 50.000 pessoas estiveram detidas, 28.000 das quais continuavam presas quando Israel declarou a independência (em 14 de Maio de 1948).
A atitude da Grã-Bretanha quer no que respeita ao “êxodo” quer no que respeita à equidade (os judeus consideravam que a administração britânica favorecia os árabes) provocou a rebelião dos judeus que teve como ponto mais negro o atentado do Hotel do Rei David. O Hotel Rei David era a sede do comando militar británico e da Secção de Investigação Criminal Britânica. O Irgún, chefiado por Menahem Begin, escolheu-o como objectivo, como retaliação ao assalto pelas tropas britânicas da Agência Judia e confisco de grandes quantidades de documentos. O saldo das baixas foi elevado: um total de 91 mortos e 45 feridos. Entre as baixas havia 15 judeus. O Conselho Nacional Judaico denunciou este atentado. Mas isso não impediria Menahem Begin de chegar, muitos anos mais tarde, a 1º Ministro (1977-83).
Incapaz de conseguir uma solução acordada entre árabes e judeus, a Grã-Bretanha transferiu a decisão para a ONU, que nomeou uma Comissão Especial para a Palestina (UNSCOP) para planear uma solução. O resultado não foi unânime: os delegados de sete países —Canadá, Checoslováquia, Guatemala, Holanda, Peru, Suécia e Uruguai— recomendaram o estabelecimento de dois estados separados, um judeu e outro árabe, ligados por uma união económica, com Jerusalém como um enclave internacional. Três países —Índia, Irão e Jugoslávia— recomendaram um estado unitário com províncias árabes e judias. A Austrália absteve-se.
Em 14 de maio de 1947, Gromiko, o delegado soviético, pronunciava-se, na tribuna da ONU, por um “estado judeu-árabe único com direitos iguais para os judeus e os árabes”, precisando todavia: “Se esta solução resultar irrealizável devido as relações cada vez mais tensas entre os judeus e os árabes (...), então teria que se estudar uma segunda solução (...) que incluísse a divisão em dois estados independentes, um estado judeu e um estado árabe”. Em 29 de Novembro de 1947 era aprovada a partilha da Palestina em 2 estados, pela resolução 181 na Assembleia Geral da ONU. A Grã Bretanha, que se absteve, anunciou que não cooperaria na aplicação desse plano e que conservaria todos os seus poderes até ao fim do mandato que fixou para 15 de Maio de 1948.
Pelos resultados da votação (4) pode verificar-se que todos os países árabes ou islâmicos votaram contra. Os países árabes declararam imediatamente que não aceitariam a decisão e que se iriam opor a ela pela violência. Entre 7 e 15 de Outubro tinha-se realizado a reunião do Conselho da Liga Árabe em Aley (Líbano) onde foi encarada pela primeira vez a possibilidade de uma intervenção militar na Palestina.
Assim começou a guerra da independência, em que o novo Estado de Israel enfrentou os exércitos do Egipto, Síria, Transjordânia, Líbano, Iraque e os próprios palestinos, muitos dos quais foram induzidos a abandonar seus lares, na expectativa de um próximo retorno com a vitória dos exércitos árabes. Azzam Pashá, Secretario Geral da Liga Árabe afirmava: «Esta será uma guerra de extermínio e de grandes massacres, da qual se falará como dos massacres mongóis e das cruzadas».
Os primeiros assaltos em grande escala começaram em 9 de Janeiro de 1948, quando 1500 voluntários do Exército de Libertação de Fawzi Al-Qawuqji penetram na Palestina. Na primeira fase da guerra, que durou de 29 de novembro de 1947 até 1 de abril de 1948, os exércitos árabes, muito melhor armados, mantiveram-se na ofensiva. Os israelitas sofreram baixas elevadas.
Em fins de Março e no seguimento do acordo estabelecido em Dezembro de 1947 e ratificado em Janeiro de 1948 em Nova Iorque por Andrei Gromyko (5) e Moshe Shertok, as primeiras armas checoslovacas chegaram aos israelitas. A ofensiva israelita irá começar com a operação Nahshon e o plano Dalet. A partir daí, e sem o empecilho das forças britânicas, entretanto retiradas, a iniciativa passará ao exército israelita.
A derrota da invasão árabe levou os países árabes a firmarem, em 1949, um armistício com Israel, imposto pelas Nações Unidas, começando pelo Egipto (24 de fevereiro), seguido pelo Líbano (23 de março), Jordânia (3 de abril) e Síria (20 de julho). O Iraque foi o único país que não estabeleceu um armistício com Israel, decidindo em vez disso retirar as suas tropas e entregar o seu sector à Legião Árabe de Jordânia. Nenhum dos estados árabes negociaria qualquer acordo de paz. As linhas do armistício, bastante mais favoráveis a Israel do que as do mapa da partilha da ONU, são as designadas por fronteiras anteriores a 1967.
A guerra de 1948 ocasionou cerca de 600.000 refugiados palestinos, quer devido aos receios da guerra, quer devido às expedições punitivas dos israelitas, quer ainda por pensarem que depois regressariam com os exércitos vitoriosos.
É esta massa de refugiados, estimados actualmente em 3 milhões espalhados nos campos do Líbano, da Jordânia e da faixa de Gaza, que constitui o problema mais espinhoso nas negociações sobre o futuro da relação entre Israel e o Estado Palestino a ser criado.
(1) A carta foi publicada no Times e dizia:Prezado Lord Rothschild,Tenho muito prazer em transmitir-lhe, em nome do governo de Sua Majestade, a seguinte declaração de simpatia com as aspirações sionistas que foram apresentadas ao Gabinete e aprovadas por ele:O Governo de Sua Majestade vê com simpatia o estabelecimento na Palestina de um lar nacional para o povo judeu e envidará seus melhores esforços para facilitar a conquista desse objectivos, ficando claramente entendido que nada será feito que possa prejudicar os direitos religiosos e civis das comunidades não judaicas existentes na Palestina ou os direitos e condições políticas usufruídas pelos judeus em qualquer outro país.Agradeceria que o senhor levasse essa declaração ao conhecimento da Federação Sionista.Atenciosamente,Arthur James Balfour
(2) O crescente fértil, que até então fazia parte do Império Otomano, foi dado em mandato à Grã-Bretanha (Palestina, Transjordânia e Iraque) e à França (Líbano e Síria).
(3) Imigrantes judeus na Palestina1919 1.806 1920 8.233 1921 8.294 1922 8.685 1923 8.175 1924 13.892 1925 34.386 1926 13.855 1927 3.034 1928 2.178 1929 5.249 1930 4.9441931 4.0751932 12.5331933 37.3371934 45.2671935 66.4721936 29.5951937 10.6291938 14.6751939 31.1951940 10.6431941 4.592
(4) Resultado da votação:Votaram a favor: 33 Austrália, Bélgica, Bolívia, Brasil, Bielorússia, Canadá, Costa Rica, Checoslováquia, Dinamarca, República Dominicana, Equador, França, Guatemala, Haiti, Islândia, Libéria, Luxemburgo, Holanda, Nova Zelândia, Nicarágua, Noruega, Panamá, Paraguai, Peru, Filipinas, Polónia, Suécia, Ucrânia, União Sul Africana, U.S.A., U.R.S.S., Uruguai, Venezuela. Contra: 13 Afeganistão, Cuba, Egipto, Grécia, Índia, Irão, Iraque, Líbano, Paquistão, Arábia, Saudita, Síria, Turquia, Yemen. Abstenções: 10 Argentina, Chile, China, Colômbia, Salvador, Etiópia, Honduras, México, Reino Unido, Jugoslávia.
(5) Andrei Gromyko, delegado soviético e futuro Ministro dos Negócios Estrangeiros, declarou, no Conselho de Segurança em 29 de maio de 1948:Esta não é a primeira vez que os estados árabes, que organizaram a invasão da Palestina, ignoraram uma decisão do Conselho de Segurança ou da Assembleia Geral. A delegação da URSS julga que é essencial que o Conselho declare a sua mais clara e firme oposição relativamente a esta atitude dos estados árabes contra as decisões do Conselho de Segurança.
Em 15 de julho, o Conselho de Segurança ameaçou acusar os governos árabes de agressão, conforme a Carta da ONU.
No conflito israelo-árabe, não foi unicamente Israel que violou as decisões da ONU. Aliás, nem foi o primeiro
In: semiramis.webblog.com.pt
1 comentário:
Hei, obrigada, fikei muito mais esclarecida sobre akela zona, bom texto, acho k deviamos todos os blogueiros interessados nesta crise ler este texto.
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